quarta-feira, 2 de julho de 2008

Minha senhora do nunca mais e da saudade,
Anúncio de todas as impossibilidades,
Rio que subitamente secou na origem,
Imagem que o tempo apaga no espelho
Antes de a memória se fixar no papel

Entretanto a vida continua,
Mil vozes ecoam no vazio,
Inesperados silêncios são sinal de desespero,
Lentas são as horas que se vão acumulando,
Irritantes e solenes, cruéis,
Antecâmaras de uma realidade que ficou suspensa
Sem ti só me chegam os ecos das coisas
e sinto-me como que cego de sentimentos.
Tudo é náusea e sonolência pesada,
imagens daquilo que poderia ter sido
e a sensação absurda de que o tempo é irrecuperável.
Sem ti sou menos eu, a incompletude,
o vazio que preencho com palavras,
as únicas companheiras que me restam.
Eu sei que as palavras são poços que escondem a profundidade
ou armadilhas que usamos para defraudar a passagem das horas
mas nelas posso ter acesso aos teus reflexos.
Eu sei que as palavras podem ser perigosas sereias
que nos desviam das viagens e nos abandonam
depois de nos seus corpos perdermos a pureza do olhar
mas sem elas o silêncio seria mais insuportável.
Sem ti o mundo ficou mais pequeno
e quase que se reduziu às minhas sensações.
sei que lá fora a vida acontece independentemente das palavras,
independentemente de mim
ou de todos aqueles que involuntariamente sofrem
e trazem o peso das coisas sobre as suas costas.
Sei que o que sou e o que sinto
é talvez nada comparado com outras situações
mas nunca quis experimentar o papel de vítima
nem nunca imaginei a tua ausência.
Sem ti há súbitos desertos onde antes havia oásis
e sei agora que isso só era possível por tua causa,
eras tu a água e eu não sei onde matar a sede.
Que farei quando as palavras se tornarem inúteis
e nada mais justificar a tua ausência?