terça-feira, 17 de agosto de 2010

Os heróis antigos transformaram-se em estátuas
e persistem nas histórias que já ninguém recorda
porque agora os heróis são mais instantâneos
e a fama dura apenas o tempo das imagens.
As naus apodreceram e os portos estão abandonados
quem ainda sonha com os impérios
são aqueles que estão viciados nos nevoeiros
e trocam tudo por um passado embalsamado
mesmo que povoado de cadáveres.
Os oceanos estão todos catalogados,
substituíram-nos por imagens em 3 D
que mumificam as sensações que possamos ter delas
e nos transmutam a nós mesmos em meros espectadores,
estátuas imóveis só com os olhos em movimento.
Se solicitarem um poeta épico para cantar as glórias passadas
escolham um cego como o velho Homero
ou então um louco como o habitual D. Sebastião,
mistura de D. Quixote com Sancho Pança,
ridículo cavaleiro que povoa os nevoeiros
ainda e sempre à procura da Dulcineia
ignorando que entretanto as princesas se tornaram mulheres.
Se precisarem de epopeias e narrativas heróicas
coloquem todas as estátuas numa praça,
recuperem os templos antigos e renovem os altares,
convertam a morte em elogio póstumo
e atrasem os relógios ou pelo menos encravem os mecanismos
com a areia que trazem no lugar do corpo.
Os mundos de hoje são menos aquáticos,
as distâncias apequenam-se num ecrã que já foi mágico,
com heróis e de loucos distorce-se a memória
e só nos resta recuperar o silêncio que ainda existe nas palavras.

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