sábado, 26 de fevereiro de 2011

Abri as sete portas míticas de Tebas
uma a uma, usando a força.
Por detrás da primeira estavam crianças que não choraram.
Conhecia-as porque elas habitavam as minhas memórias.
Assustavam-me os seus olhos sérios
de quem não sabe brincar
e a sua permanente e muda acusação.
Uma delas parecia-se vagamente com o meu pai,
tinha um ar circunspecto e triste
e olhava para mim como se quisesse recuperar algo que perdemos.
Por detrás da segunda porta esperavam-me as esfinges,
envelhecidas, cansadas das maldições do tempo.
Apesar de tudo não me agradeceram.
Na terceira e na quarta portas não havia ninguém
e o silêncio e o vazio escorriam pelas paredes nuas.
Passou depois um século em que hibernei
porque também eu preciso de descanso.
Nesse tempo Tebas desapareceu do conhecimento dos homens.
Por isso ninguém soube quando arrombei as últimas portas.
Os livros que lá havia queimei-os em inquisições privadas
e as coisas que vi prefiro esquecê-las.
Ficaram presas nas palavras as crianças e as esfinges.
Enquanto os outros senhores da guerra comemoravam as suas vitórias
eu tentava reconstruir Tebas e as sete portas
mas só sobravam escombros e a minha imagem,
reprodução imperfeita do meu pai,
esfinge que se esqueceu que um dia foi criança.

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